28 de agosto de 2009

Certos olhares para lua



Numa dessas noites estavam meus pensamentos, felizes, fingidamente...

"... as nuvens, super enciumadas armaram-se e impediram um quase 'chamego'/'paquera' da sedutora lua. Às 23h consegui avistá-la meio encoberta, lançando-se repleta de artifícios eróticos, aproveitando-se do seu brilho inigualável à expectativa dos seus apreciadores. Um pouco distante, porém visível, estava a 'outra' lua, talvez numa roupagem diversa que não a verdadeira, que aliás me pareceu incremento fundamental para o momento tão aguardado por elas (as luas) e por 'curiosos' de olho no 'namorico' alheio. A outra lua, aparecida só para esse momento, mostrava-se pequenina, no entanto apontava que em alguns minutos estaria pronta para uma dança romântica, fosse ela tomar a outra nos braços ou ser tomada, o interessante talvez estivesse na troca de energias (ultra) naturais de ambas. Depois de certos minutos as nuvens haviam coberto todo o cenário, faziam-se senhoras guardadoras de uma pretensa inocência da sedutora lua. Não consegui mais nem localizar a pequenina que nessa noite chegara ao recinto da fêmea sedutora para uma noite de breve amor. Dei mais um tempo... e nada, as nuvens decididamente não cederiam. Assim me fui, fiquei ainda a aguardar mais um pouco, porém o sono e o cansaço do dia aos poucos me encaminharam. Na verdade me entreguei ao sono na conclusão de que o romance naqueles instantes atingisse o auge, preservado dos olhares de outrem, pois no momento da troca talvez se efetivasse a anunciação de tantos poetas, da entrega como acontecimento de união, onde a matemática não se faz nobre no entendimento de um + um equivaler a um. Fiquei alguns minutos a pensar nesse processo do encontro, da conquista, do romance, da sedução, do requinte ora despretensioso, ainda lembrei das palavras do oficial russo Pietchórin ao lembrar de Vera, lembrei ainda as palavras do Sr. Proust e dos amores que construímos e que por momentos nos perdemos neles e deles... enfim, vaguei pelo universo minutos antes de liberar a alma pelas andanças noturnas, destaque, noites esta em que a lua amava..."

Noutra noite...

"Hoje os deuses comemoram Maio num baile nobre cuja música é maestrada pelos trovões, a iluminação profética conduzida pelos relâmpagos, o vento responsável por embalar os convidados, a chuva, ah essa chuva, tal como a singularidade do erotismo feminino ela baila pelo salão encantando loucamente sua amante, a lua..."

Carol Gomes

18 de agosto de 2009

É meu caro Proust, e quantas cidades erguemos no íntimo do nosso ser, ou melhor, dos nossos seres. Cidades estas que ao passo dos dias ampliam-se, multiplicam-se as esquinas, elevam-se potencialmente as ruas, surgem-nos arranha-céus, erguem-nos monumentos, além do quê, tantas outras edificações, tantas outras construções anunciam-se em ruinas... Eis que nos fica o movimento vivo da vida.
(...)
"E ainda hoje, se numa grande cidade provinciana ou em um bairro parisiense que eu mal conheça, um transeunte que "me mostra o caminho" me aponta ao longe, como ponto de referência, uma torre de hospital, um campanário de convento que ergue a ponta de sua torre eclesiástica na esquina de uma rua pela qual devo seguir, por pouco que minha memória possa, de modo obscuro, achar nele algum traço semelhante à figura amada e desaparecida, o transeunte, se se vira para se assegurar que não vou me perder, pode, para seu espanto, dar comigo, esquecido do passeio projetado ou do caminho a trilhar, ali parado, dante do campanário, durante horas, imóvel, tentando lembrar-me, sentindo, no fundo de mim, terras reconquistadas ao esquecimento, que vão secando e se delineando; e nesse momento, sem dúvida, e com mais ansiedade que há pouco, quando lhe pedia que me orientasse, procuro ainda o meu caminho, dobro uma rua... mas... do meu coração."
(Marcel Proust em No Caminho de Swann)
(...)
Proust, Sr. Proust, observo-te esses três pontinhos que antecede e que logo retornam a suceder o 'mas' e que no complemento encontram o coração.
Carol Gomes