Lá sou a mais
faminta das cafetinas; dou e devoro a despeito dos olhares julgadores alheios.
Dou às
interrogações professorais do Deleuze, e, cômo salivante suas criaturas
filosoficamente estetizadas. Do Deleuze enrabo todas, embora na hora do gozo me
regaço inteira em líquido desregrado das faculdades. Pego-me oferecida de
quatro, em pé, esticada no chão, pressionada na parede, molhada no chuveiro sem
cair uma gota. Óh! Deleuze me prazera sensitivamente num movimento
contraidamente selvagem e animal.
O mais emputecedor
e discreto, és Platão. Grega é sua nacionalidade aparente, porque na suíte
ele é um africano lorde. Me adentra sempre dialogando, e num tempo partícipe me
sequestra para compor, rebaixadamente, suas louquíssimas hierarquias
orgiásticas. Nele e com ele me visto de todas as almas, da guerreira altiva à
artista que expulsa grita gemendo: seu puto! Sei lá por quais motivos é um dos
frequentadores contínuos do meu corpo. Quem sabe porque condena-me justamente
por ser um mero e aprisionante corpo. Sempre que parte, vejo em relances
sua sombra presentificada em: “será que depois de Platão prazerarei novamente?”.
Como toda cafetina
vivo também as rapidinhas. Ah, das tantas lembro a do Barthes, o popular
Barthes. Chega, tira a roupa, fode e pronto. Viro a página e me pergunto: deu?!
A trepada com Locke
foi interessante e uma única vez. Chegamos à cama com agendas bem definidas,
horário cronometrado. Um ser amarradinho, meia e cueca combinando, e de quebra
um suspensório, erradamente grampeando a cueca. Ridículo mas estranhamente um
elemento erótico. Segundo um tal tratado da natureza fui trabalhando e erguendo
minha propriedade corporal, e ele, o Locke, silenciado demonstrava “ir” sem “chegar”,
fuder sem gozar, tipo coito reprimido. E nessa “lenga-lenga” ficamos uma
semana, para dias seguintes eu avaliar: foi bom para alcançar o fim e cumprir a
agenda!
Na mesma agenda,
semana seguinte, estava a Hannah Arendt. Caramba, o que será?! Preparei o
cabaré, troquei as roupas de cama, troquei as toalhas, lavei o cinzeiro,
desliguei o telefone e isolei a campanhia. Tomei um banho demorada, depilei as
páginas, coloquei uma super roupa no estilo estudante-universitária. Quando ela
chegou meu diafragma travou: nú, que mulher é essa?! Um misto de
amargura-doce-maternal. Fomos nos virando num vai e volta de letras. Sempre
olhava desconfiada para ela porque sabia que ali tinha um Agostinho santo e um
moralista Kant; mas vai lá, depois de um tempo ela me seduziu, deveras com
dificuldade de entendimento (da minha parte, claro!), e creio mesmo que só lá
pelas findas páginas é que relaxei os músculos chamando o úmido, subitamente, quando moveu seu olhar na direção do meu e tragou algo como que: “só educa quem ama o
mundo o suficiente para querer que ele continue”. Despedimos e ela saiu,
elegante e ereta. Sei que voltará outras muitas vezes, como de fato voltara
mais umas 2 ou 3 recentemente.
No cabaré acham que
foi com Deleuze que aprendi trepar com plateia. Óh, ingenuidade! O feito veio
do Marx. Nunca vi igual, jamais chegava sozinho, sempre acompanhado de um
grupo, e junto os tais do Engels e Gramsci. Estive com o Marx um tempo possível
de contabilidade considerável, embora sempre flertasse escondido com o outro titã de nome Bakunin. Marx era
costumeiramente fantasioso, exigia cenários na cama e não abria mão das
cadeiras para os convidados. Engraçado, me lembrava muito os “bombados” de
academia que malham se exibindo para o espelho e para os que rodeiam. Todas as
posições eram combinadas para que o coletivo assistisse. Sem dúvida que Marx
gozava com os suspiros da plateia, e eu gozava na duplicidade desses mesmos
suspiros, tipo um espectro que você insiste acreditar ao ponto de sentir
pairando mas sem jamais saborear. Era estranho mas me excitava, tanto que
insistíamos na trepação.
Não sei se chamo de
sexo estranho ou sinistro, só sei que era desafiante todas as vezes que o
Nietzsche chegava. Primeiro grande desafio era o bigode (muito mais terrível
que a barba do Marx); um bigode que guardava cheiro próprio e que nenhuma das
minhas faculdades encontrava semelhante. Na verdade foi o Deleuze quem
apresentou o Frederich ao cabaré. Claro que eu já tinha escutado falar dele,
mas daí, experimentar sua transa foi outra novela. A primeira vez foi mesmo
muito estranha, chegou muito sério com uma caderneta transbordando escritos em
notas musicais, palavras com símbolos gregos e também algumas poesias. Ele
gostava de trepar no banheiro e no sofá, tudo inesperado, como se de uma
palavra estranha já nos agarrássemos e explodindo uma quentura louca e
alucinada meu corpo entrava todo no dele que por sua vez já estava internamente
em mim. Isto me dava muito medo, muito mesmo. Sentia minhas forças vitais
vibrarem, meu organismo se auto-consumir, minhas moléculas se expandirem e as
células ficarem pequenas para comportar. Nas nossas transas eu bebia apenas
após o gozo, bebidas fortes ao som de músicas alucinógenas. Ao mesmo tempo que
era um sexo animal (e maravilhoso), era também atormentador. Ao acabar ele
seguia rumo à porta e eu ficava estagnada na cama olhando aquela estranheza
fluindo como que partículas físicas da luz. Eu hein?! Sempre muito sinistro. Em
fato nem o achava tão bom de cama, era tímido, calado, mas a atmosfera que
trazia consigo era hipnotizante. Fato inquestionável é que depois dos gozos com
ele, não mais me satisfazia com “meia boca”, desejava sempre a enésima
potência. Foi Nietzsche quem me ensinou calmamente a dançar na hora do sexo...
bailar no chão do quarto sabendo da quentura da cama. Estranho e viciante!
Nossa, experimentei
brevemente transas horrendas, Habermas e Sartre, credo! Sem comentários! Não
digo que apenas por eles, certamente devia-se aos meus dias de forte TPM;
prefiro nisto crer.
Dilthey esteve no
cabaré num momento fotográfico e deliciosamente se permitiu entrar no meu ensaio-experimental-fotográfico, ainda que na despedida tenha dito: “Envolvente, embora sem entendimento!”. Com
razão, peguei escancaradamente seu “enigma da vida” e coloquei com os “Duane
Michals” pendurados por todas as paredes do quarto. Foi um sexo de flash; para
cada gemido uma captura da luz.
Ah quantas transas
nesse cabaré diário de pensamentos. Prostituição viva de conceitos e sensações.
Não haja, indubitavelmente, uma página que eu não leia experimentando, dando-me
e devorando.
Passaram e
continuam a passar vários, oficiais e nem tão oficiais; nomes dessa sedutora
história da filosofia. Às vezes europeizada e às vezes super trópica (diga-se
aos comentadores alimentadores ‘orgiásticos’...).
Causos
antropofágicos das páginas de Foucault, Aristóteles, Descartes, Heráclito,
Anaximandro, Kant... hoje, presentemente, Bergson. Alguns que já nem lembro. Outro que me seduziu com flores e Napoleão, o ‘ergueiro’ das aparências
escondidas que só ele via: Hegel.
No meu cabaré
passam também sofistas e passam artistas, sempre! Os cientistas ensaiam passagens
vestidos de personagens de tantas literaturas, ao estilo: “o céu de Ícaro tem
mais poesia que o de Galileu...”.
Nesse cabaré tenho
desaceleradamente regaçado minha fome amante nos meandros de pensamentos vivos
que transbordam pulsando. Sempre usando e abusando das páginas-imagens.
Sim! Prostituindo-me assim tenho saboreado universos contraídos e distendidos numa
epiderme sensitivamente pensante.
(lorac semog)
para minha amiga Torino que um dia desvelou o samba da sonoridade da língua grega,
afetos e saudade de você que já não vejo mais.