19 de março de 2014

A historinha é mais ou menos assim

Estávamos na Nacional Expresso no trajeto de Goiânia (capital na região central de um cerrado genuíno), para Ituiutaba, (região pontal do Triângulo Mineiro). Eu na poltrona 13 e o Lucas com a mãe nas poltronas 19 e 20.

E então o Lucas começa:

Mãe, onde estamos?
A mãe responde: Saindo de Goiânia.

E o Lucas faz outra pergunta: Daqui o ônibus vai para onde?

A mãe: Vai para Morrinhos.

Lucas pergunta novamente: E depois de Morrinhos vai para onde?

Vai para Itumbiara. Respondeu a mãe começando a sinalizar impaciência.

Depois de Itumbiara?
Vai para Centralina.

E depois?
Canápolis. Disse a mãe já meio monossilábica na resposta.

O Lucas diz: A gente desce em Canápolis e aí o ônibus vai para onde?

Ituiutaba! Ituiutaba, Lucas!
Resposta atingindo um surto de impaciência com as perguntas.

O Lucas manda outra pergunta: E depois de Ituiutaba o ônibus vai para onde?

A mãe então em tom nervoso: Acaba, aí ele não vai para nenhum lugar, é o fim!

O menino ficou calado e soltou alguns segundos depois a pérola da noite:
Então Ituiutaba foi onde Judas perdeu as botas?!

A mãe não falou nada, ficou calada e só soltou um suspiro do tipo: 'é hoje!?'

E então fiquei pensando no quão próximo o fim do mundo pode estar. Veja só, para o Lucas passou a estar no bico das Minas Gerais.

Suspensa na poltrona 13 fiquei divagando na conversa alheia no serviço ou no des-serviço da mãe do menino ao lhe dar a possibilidade de imaginar onde estão as botas de Judas, e, ao mesmo tempo de anunciar onde encontrar o fim do mundo.

O Lucas deve ter uns 6 anos, a mãe uns 26, e eu na casa dos 30... fiquei viajando, literalmente, pelas etapas que a gente vai passando por essas BRs até topar com o fim do mundo, e que quando a gente topa, o mesmo fim do mundo dá mais uns passos para gente não o enxergá-lo.

Para o Lucas, Ituiutaba passou a ser o fim nesta noite, mas só até o dia em que ele sozinho sair de Canápolis e encontrar nas terras do Tijuco o começo de outros territórios por onde as botas de Judas andam.

Carol Gomes

Nenhum comentário:

Postar um comentário