8 de janeiro de 2018

Segunda-feira de janeiro de 2018, 6:45, chuvinha calma, passarinhos cantarolando na mangueira e a cabeça atinando para a jornada cujas demandas cotidianas pululam.

8:30 eis que um país inteiro te solapa em pouco menos de 5 minutos. Posto de combustível com gasolina a 4,39 e álcool a 2,88. A promoção é única e nenhum outro lugar da cidade com 700 mil habitantes alcança essa façanha, e o mais próximo concorrente ficou longe pedindo 4,65 na gasolina. Quando tem promoção não há titubeio e a fila de espera para encher o tanque é quilométrica.

9:05 de frente para bomba, os olhos se inquietam entre a pistola de onde sai gasolina, álcool ou diesel e o painel que cronometra a relação entre preço e litros. Em segundos a retina recebe estímulos de prazer e de dor, de conservação e de ameaça, pois a pistola em pleno funcionamento é sinal de tanque cheio e mobilidade garantida com o tanque do carro cheio, mas a cada jato da pistola o cronômetro roda e inversamente diminui as notas da bolsa ou o limite do cartão. É isso que um posto de gasolina não tarda em ensinar, quiçá ensinamento mais direto que quaisquer aulas de proporção inversa, pois mesmo o mais romântico ou o mais bobo ser humano percebe que quanto mais a pistola libera líquido combustível, menos dinheiro se tem na poupança. Mais combustível, menos dinheiro; ou, menos combustível, mais dinheiro; ou, mais locomoção sem aperto e atrasos de ônibus, menos dinheiro; ou, mais tanque cheio, menos economias, e assim vai a relação inversa, altera-se as variantes e a relação inversa permanece. O fato é que à fórmula imperecível outros tantos fatores são conectados, por exemplo: se você opta por menos pistola funcionando e portanto menos combustível no carro, o desdobramento é que a locomoção no automóvel deverá diminuir, e considerando que não é possível viver isolado em casa, o próximo desdobramento é se locomover a pé, de bicicleta, transporte público ou outro modo: uber, táxi, carona. Se na opção da locomoção à pé ou da bicicleta os gastos diminuem, em contrapartida numa cidade com ausência ignorante de arborização, a economia no combustível custará gastos na proteção da pele e com calçados para longas caminhadas. Se a opção é por transporte público: dispensa comentários. Se a opção é uber, táxi, experimente ir ao trabalho a 30 quilômetros de casa calculando ida e volta diariamente. Se a opção é carona, considere as instabilidades, afinal carona é carona e não prestação de serviço. Disso tudo esqueça o fator segurança, sobretudo quem optar por bicicleta e ou caminhadas.

Pois bem, passado esse momento de reflexão lucífera (seja por evocar a luz ou por evocar ação do anjo decaído), os olhos estimulados não se aquietam e se lançam no envio de estímulos ao sistema nervoso que solicitará outros dispositivos do corpo para atuarem diante da relação inversa que funda as atividades lucrativas das redes de combustível.

- Bom dia moço, tudo bem?
> Tudo bem.
- O senhor completa por favor com álcool?
> O álcool está em falta, só temos gasolina e diesel.
Em fração de segundos o cérebro dispara: diesel? Isso é para motor grande. Álcool em falta? A festa acabou.
- Mas moço, como assim não tem álcool?
> É minha filha, tem 2 dias que não chega álcool, e nos disseram que a Petrobrás parou de liberar álcool.
- E tem previsão para retornar?
> Não, não tem previsão.
O olho fixa na marcação do painel no carro com a luz da reserva já acesa e delibera:
- Coloca 100 reais de gasolina, por favor.
> Ok, 100 de gasolina?
O cérebro trabalha em silêncio: é né, você reproduzindo essa conversa furada do dono do posto para justificar gasolina com esse alto preço e segurando álcool para nos próximos dias reajustar o preço absurdamente.

Nesse interim a pistola começa a trabalhar e libera gasolina no tanque. A máquina começa a liberar o som do líquido sendo injetado e em pleno movimento em direção de partida da bomba para o tanque do carro. Enquanto isso o diálogo vai tomando rumos que todos conhecem embora por mistérios lucíferos (olha a luz ou anjo aqui novamente) os responsáveis não se assumem e muito menos não se dignam à correção.
- Pois é moço, muita gente me disse em 2016 que o problema era a mulher?
> Como assim a mulher?
- O país era governado por uma mulher e por isso estava tudo caminhando para a falência. O problema é que quando ela estava governando a gasolina era 3,30 e não faltava álcool na pistola.
> Pois é.
- E agora?
> Agora é trazer ela de volta.
- Entendi. Obrigada. Vou ao caixa pagar.

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